"Surrectio" e o direito do curatelado de permanecer no plano de saúde
- jamile garcia de lucca
- 11 de jul. de 2022
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O instituto da Surrectio foi aplicado no caso onde um idoso curatelado, sob os cuidados de sua irmã, foi inserido em seu plano de saúde como dependente. No entanto, no ano de 2018 a operadora do plano de saúde comunicou a exclusão do curatelado do referido plano, uma vez que o regulamento não considerou que o irmão curatelado preenchia os requisitos para ser equiparado como dependente. Ao analisar referido caso, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça assegurou o direto do idoso de permanecer no plano de saúde de sua curadora e irmã.
Ao aplicar o instituto jurídico deu-se prestigio as derivações do princípio da boa-fé objetiva. "Surrectio" deriva do latim que significa "surgir", "conquistar", "alcançar", "obter" um direito em virtude do exercício de uma conduta repetida. No caso, "o fato da operadora haver permitido por mais de sete anos que o irmão figurasse nessa condição gerou a aquisição do direito. Para o STJ, o decurso do tempo fez surgir a expectativa legítima de que a situação seria mantida".
Sobre a surrectio António Manuel Menezes Cordeiro (1984, p. 821-823) afirma que:
"A surrectio tem sido utilizada para a constituição ex novo de direitos subjetivos. Portanto, pela surrectio ocorre não a paralisação de um direito {ou da possibilidade de exigir}, mas o surgimento de um benefício conferido à contraparte".
A Jurisprudência (julgados do Judiciário) já aplicou tal instituto em outros caso semelhantes, a exemplo:
PLANO DE SAÚDE. MANUTENÇÃO DE DEPENDENTE APÓS A MAIORIDADE. Pedido de manutenção de filha na condição de dependente de seu genitor após completar a maioridade. Sentença de procedência. Apelo da ré. Previsão contratual de exclusão dos filhos maiores do plano de saúde contratado pelo genitor. Inércia da operadora por mais de 20 anos. Expectativa legítima dos autores de manutenção da filha maior na apólice, mediante pagamento das mensalidades. Supressio/surrectio. Exclusão da dependente após período prolongado de tempo que caracteriza comportamento contraditório contrário à boa-fé objetiva (venire contra factum proprium). Precedentes. Ação procedente. Recurso desprovido. (TJ-SP - AC: 10141835520208260002 SP 1014183-55.2020.8.26.0002, Relator: Mary Grün, Data de Julgamento: 15/02/2021, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/02/2021)
Assim, independente do que estava contemplado no plano de saúde, "entende-se que, dadas as particularidades do caso, o comportamento omisso da operadora de saúde durante significativo lapso temporal, excepcionalmente, implicou a assunção da obrigação de prestação do serviço de assistência à saúde ao curatelado, na qualidade de dependente de sua irmã e curadora".
"Um contrato não deve ser apenas justo, conforme a ideia de <<justiça>> derivada do sistema e da válida e eficaz declaração negocial. Deve igualmente ser útil, pois essa é a sua finalidade: promover a circulação de riquezas, satisfazendo necessidades"
Referências:
MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado. São Paulo: Saraiva, 2018.
MENEZES CORDEIRO, António Manuel. Da Boa-fé no Direito Civil. Coimbra: Almedina, 1984.
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